O Melhor do Mundo são as Crianças…
No mundo de hoje, a abertura e a tolerância são o mote presente em todas as circunstâncias. Aceitam-se as uniões de facto e os casamentos homossexuais, mas não há dose de tolerância suficiente para nos fazer compreender a pedofilia fora do âmbito da patologia. Muito se tem falado deste fenómeno que mancha a sociedade a propósito de casos que aconteceram na Suíça e, de há cinco anos a esta parte, bem mais perto de nós, na Casa Pia. De vez em quando, surge a notícia de que este ou aquele professor foi acusado de seduzir alunos. No entanto, mais arrepiante, ainda, é a onda de escândalos de pedofilia que tem vindo a afectar a igreja católica em países como a Irlanda, a Holanda, a Alemanha, a Áustria, a Espanha e os Estados Unidos e que tem estado na origem de debates sobre as repercussões do celibato e da abstinência sexual nos sacerdotes, tradição milenar que o Vaticano continua a defender de modo ferrenho, argumentando que a maioria dos casos de abuso acontece dentro da família e não em meios religiosos, por isso tal posição não passa de uma instrumentalização das recentes denúncias de pedofilia.
A gravidade das suspeitas levantadas, que também envolvem a alegada conivência do papa Bento XVI, obriga a um esclarecimento convincente e urgente por parte da Igreja sem qualquer tentativa de escopo na fragilidade de um líder de 83 anos que já não consegue acompanhar um acto religioso sem o recurso ao “papamóvel”. Uma religião, seja ela qual for, usufrui de um papel importante nas sociedades, em geral, e no indivíduo, em particular, enquanto veículo de transmissão e de garantia da preservação de determinados valores, mas usar da boa fé dos seguidores para exercer actos que negam os princípios mais elementares é uma política desastrosa, na medida em que derruba qualquer alicerce, independentemente da força da sua sedimentação. O triste episódio “Murphy” passado com crianças surdas e outros que já fazem lista por muitos lados, incluindo também nomes portugueses, estão a movimentar grupos de católicos que pretendem questionar o papa, exigindo dele, no pleno desempenho do instituído estatuto de representante de Deus na Terra, uma tomada de posição firme e disciplinadora, mas, sobretudo, dissuasora de repetições e recidivas. Ignorar que se vive a pior crise do pontificado de Ratzinger não será a melhor solução; todavia encetar um processo de vitimização traduzir-se-á, seguramente, numa estratégia errada, já que o slogan “caça às bruxas” faz-nos lembrar acontecimentos passados que pouco abonam a favor da Madre Igreja.
É imperioso que as famílias católicas consigam reatar a confiança nos membros do clero, sob pena de ser irremediável a perda de fiéis que, cada vez mais, escasseiam nas cerimónias dominicais. Muita da fé perdeu-se devido a algum fundamentalismo temperado com posições retrógradas e desfasadas das realidades sociais, mas provar-se que padres e bispos foram protagonistas em actos de pedofilia e mereceram o silêncio por parte dos seus responsáveis hierárquicos poderá ser a machadada decisiva na grande congregação dos católicos do mundo. Nunca nos esqueçamos de que estamos a reportar-nos a países ditos desenvolvidos e não a países de um mundo, tantas vezes olhado como menor, em que as crenças ditam, por exemplo, que estabelecer relações sexuais com bebés, por serem crianças sem mácula, pode curar a SIDA.
Pugnemos todos, ultrapassando as diferenças de qualquer ordem, por vivermos num espaço social que se coadune com as sábias palavras pessoanas, sempre actuais, “grande é a poesia, a bondade e as danças…/ mas o melhor do mundo são as crianças…”
Teresa Adão, in Jornal Beirão, 3/10
domingo, 4 de abril de 2010
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