Um Zero sem Valor
No sofá branco de imitação de pele, os dez algarismos ajeitavam-se para ver o telejornal. Nunca lhes tinham dado tanto protagonismo nas notícias e eles sentiam-se privilegiados. É que, além de falarem deles organizados em números, ainda apareciam na televisão primorosamente desenhados e muito coloridos, facto que ainda lhes dava mais destaque. Quem não estava bem sentado era o Zero que, tendo o sofá apenas nove lugares, era sempre empurrado pelos outros. Se não fossem o Seis e o Nove que, tendo pena dele o aconchegavam um com o seu braço esquerdo e o outro com a sua perna direita, o infeliz Zero não conseguiria saborear o prazer de ser vedeta de televisão. Não se pense, todavia, que os restantes algarismos eram egoístas e mal formados, escorraçando sem motivo o companheiro. Na verdade, no Natal passado, quando o sofá foi comprado por todos, o Zero, o Um e o Dois bateram o pé e declararam que só pagavam a parte correspondente ao valor dos respectivos números. Acontece que, sendo assim, o Zero não contribuiu com nada para a aquisição do sofá branco. Ora, dado que a família dos algarismos era constituída por dez elementos e não encontraram em nenhuma loja um sofá com esse número de lugares, quem ficava sempre de fora era o Zero e acreditem que nunca refilava com medo de receber uma má resposta que o deixasse sem capacidade de argumentação.
Sem comentários:
Enviar um comentário